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evig: (ensaio)
Eu não sou fã de visual novels, e li apenas um livro-jogo bem ruinzinho. A lógica de procurar um final feliz me incomoda, e eu até tenho nas minhas notas de coisas para “tentar escrever antes de morrer” um livro-jogo em que o crescimento emocional do protagonista é mais importante que as peripécias ou o final (seria uma espécie de romance de formação para adolescentes). Black Mirror: Bandersnatch é muito mais interessante porque amarra a noção de livre-arbítrio no tema e na forma. O final feliz aqui não importa, na verdade, nem o “melhor” final importa tanto. Jonathan Tadeu disse num tweet que o filme nos dá a impressão de que comandamos o filme, mas é ele quem nos comanda e eu tive exatamente essa impressão junto com uma outra que vou expor mais pra frente.
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evig: (chifres)
Eu pensei em começar esse texto mais ou menos assim: The End of the F***ing World tipifica, em dois personagens, sentimentos que todo adolescente sente.

Mas aí eu lembrei que nem todo adolescente era deslocado ou queria dar um soco nos pais, explodir a escola, fugir, tacar o celular no chão. Então eu pensei em começar assim: The End of the F***ing World tipifica, em dois personagens, sentimentos que a maioria dos adolescentes, os deslocados, sentem; embora a adolescência possa ser definida como um sentimento constante de errância. Mas eu esbarro sempre na minha experiência. Até pouco tempo, eu achava que isso que eu acabei de dizer era verdade absoluta, que todo mundo que passou por essa fase se sentia mal, errado, irritante e deprimido. Foi só sair um pouco da minha bolha pra perceber que as pessoas não estavam fingindo que estavam confortáveis em seus papéis. Então hoje eu preciso aceitar que , talvez, a maioria dos adolescentes consiga passar por essa fase confortáveis, se divertindo em irem contra os pais que nãos os entendem.

Então eu preciso reformular o inicio do texto sobre a série: The End of the F***ing World tipifica, em dois personagens, sentimentos que os deslocados sentem por toda a adolescência. Porque é isso, James é o esquisito que acha que é psicopata e quer matar pessoas (quem nunca pensou nisso?!) e Alyssa é a que sente raiva por tudo e tem uma incrível consciência da vida medíocre que a espera (novamente, quem nunca pensou nisso?!).
Primeiro, quero esclarecer que a série resolve essa possível psicopatia de James, o que me aliviou pra caralho, já que a premissa “psicopata que se apaixona” é ridícula. Eles não sentem empatia, portanto, não podem se apaixonar. O que as ficções sobre isso fazem é dar uma super força a um sentimento que nesses casos são tudo, menos amor. Mas não vou dar spoilers.

Alyssa é a força motriz da dupla e é quem toma a maioria das decisões. Adoro o prazer que ela tem em humilhar todo mundo só pelo prazer de ser a esquisita e dizer o que pensa. Claro que depois ela se arrepende porque magoou as pessoas, mas ela tem 17 anos, então esse sadismo juvenil é mesclado com a romantização que ela faz do pai ausente. Acho esse arco maravilhoso porque todo mundo tem um momento na vida que percebe que seus pais (um deles, ou os dois) são pessoas cheias de defeitos e que possivelmente foderam com o psicológico de seus filhos. Aliás, isso vale para o James, mas o caso dele é bem mais complicado… não quero dar spoilers.

Mas essa consciência dos defeitos dos adultos/pais não impede que eles vejam que de alguma forma, eles tentaram, falharam, mas tentaram.
O que mais me toca é que eles conseguem conforto um com o outro, nem tanto pelo romance, mas pelo apoio e empatia.

A série foi baseada na HQ de Charles S. Forsman que não saiu no Brasil.
A trilha sonora também é legal. E eu gosto do final, não quero uma segunda temporada.
evig: (04 - banco)
Quando eu era pequena, minha mãe me perdeu na feira. Depois de um tempo, ela foi me encontrar na banca de maçãs. Eu tinha 3 anos.

Podemos pensar que, sendo uma garota, que saiu dos cuidados maternos para ir atrás de uma maçã, estamos falando de um conceito edipiano e bíblico, já que a maçã é associada ao pecado original de Eva, mesmo que não tenha a palavra “maçã” em Gênesis. O que quero dizer é: e se fosse um menino, e se fosse um pai, e se fosse uma pera? A do pai é fácil, se a menina fugiu dos cuidados do pai, ela está fugindo do patriarcado, e encontrando a maçã, o “pecado”, então ela encontra a sua liberdade (sexual?). Se for um menino, é o drama edipiano e a maçã simboliza o sexo oposto (corte a maçã ao meio e verás). A pera é mais difícil. O que a pera simboliza? Acho que no Brasil, onde o caso aconteceu, especificamente no interior do estado de São Paulo, não significa mais que uma fruta. Mas ela deve ter suas simbologias em outros lugares. Se esse caso se passasse na China, poderíamos associar a fruta a separação, já que a palavra homófona de pera em mandarim significa separação.

E temos que por uma data neste caso! Ocorreu no início do anos 1990. Pensando que a internet e os gadgets se popularizaram no Brasil a partir dos anos 2000, se o caso tivesse acontecido 10, 20 anos mais tarde, a maçã seria um símbolo da tecnologia como um alcance de maturidade.
Mas estamos ignorando o ambiente mais imediato, a feira. O que a feira simboliza? Compra e venda de alimentos, em geral, frutas e legumes. Prática medieval, portanto uma volta ao mundo não industrializado. O que uma menina pegando uma maçã depois de sumir da vista da mãe significa neste contexto? A volta ao útero (corte a maçã ao meio e verás) da terra? Uma recusa ao laço parental em adesão ao laço biofeminista? Biopunk (a menina se revelou contra a mãe não pagou pela maçã)? Biolésbico (corte a maçã ao meio e verás)?

E se tudo isso tivesse sido no mercado? Seria uma relação transgênera? O que isso significa?
evig: (03 - nuvens)
Fã é um bicho esquisito. Você perde a habilidade de interação e fica feliz com um simples "oi"; com uma dedicatória no encarte do seu álbum preferido (os últimos exemplares). Você olha pro Renan e só consegue dizer "brigada", não pela dedicatória, e ele diz "brigado", talvez por você ter comprado o álbum, ou por você ouvir a banda. E quando o Gustavo e o Cícero aparecem para socializar com as pessoas, você só fica feliz de ter visto eles circulando por ali e de poder ouvir a voz do Renan perguntando o nome da outra fã que quer dedicatória. Quando o Vitor sobe no palco e olha para a plateia inteira, sorrindo, você acha que ele te viu e fica feliz. Você acha que o Renan tocou "A Escrava Isaura" especialmente pra você. Você acha que o discurso motivacional do Vitor é pra você (você sempre acha que os discursos do Vitor são pra você). E você se sente orgulhosa de ser fã da banda quando outros fã sobem no palco, duas vezes, e canta junto com você e fazem mosh e pulam e choram com "Gaúcha" e gritam "quebra essa porra, caralho!". E perceber que os músicos estão tão felizes quanto nós, os fãs.

Minha mãe disse pra colega dela que "coitada, a Ju nunca sai. Ela não tem amigos". Ah, mãe, eu tenho muitos amigos, mas eles não sabem disso.


[fotos do álbum no instagram; por alguma razão eu não consigo incorporar as fotos aqui]
evig: (01 - orvalho)
Postei minhas músicas spoken word lo-fi no bandcamp!

https://onomesechama.bandcamp.com/releases